domingo, 9 de fevereiro de 2025

HISTÓRIA COM CU NO MEIO...

                   Pensam que foi em Brasília? Não foi. Foi aqui mesmo.

            Assumiu a direção de hospital público municipal e, querendo tomar pé da situação, pediu à administradora vista do organograma. Tudo parecia dentro dos conformes quando deu de cara com um cargo de chefe da enfermaria, coisa que nunca existira naquela casa. Era um tal de Alberto, doutor Alberto. Perguntou quem seria e descobriu sua amizade de infância com o premier do município, que o tratava por “Beto” ou “Betinho”.

            Beto quase não punha os pés no hospital. Tinha duas situações na casa – uma como plantonista na emergência, outra como chefe da tal enfermaria. Como plantonista teria uma carga horária de vinte e quatro horas dividida em duas de doze, das quais só cumpria seis – e durante o dia. Como chefe da enfermaria não trabalhava. Afinal, nunca se precisou desse tipo de chefe por lá.

            Não teve conversa – mandou chamar o doutor Beto. Sem muitos dedos, deu-lhe duas alternativas: ou cumprisse a carga dos plantões, ou continuasse com as seis horas, vindo ao hospital três vezes na semana resolver as pendências da enfermaria.

            - Rapaz, faz isso comigo, não. Sou amigo do homem, ele me colocou aqui.

            - Tem jeito, não. Ou uma coisa ou outra. Pensa aí e depois me diz.

            Um mês depois mandou novamente chamar o Beto:

            - Vai dar, não. Sem condição.

            - Então vou ter que abrir um processo administrativo aqui, rapaz.

            - Pode abrir – retrucou Beto numa tranqüilidade budística.

            Abriu-se o processo com todos os efes e erres – funcionário relapso, não cumpre a carga horária, não comparece aos plantões, gasto de dinheiro público, etc. etc. etc. E o negócio seguiu os trâmites.  

            Dias depois bate o telefone do diretor. Era o secretário de saúde.

            - Fulano, há quanto tempo! Aparece qualquer dia pra gente bater um papo! Como vai o hospital? E tal e coisa, e coisa e loisa, pa-rá-rá, pê-rê-rê...

E, um monte de firula depois:

- Rapaz, estou recebendo aqui o processo do Beto. Não leve a mal, mas faz assim – não mexe com ele, não. O homem é amigo de infância do prefeito, meu chapa.

O diretor calado permaneceu. O outro continuou:

- Jogavam bolinha de gude, futebol de botão, pelada em terreno baldio, brincavam de esconde-esconde... Deixa ele no lugar dele. O homem já ligou enchendo o saco...!

Dois meses depois o diretor perdeu o cargo. O Beto? Se brincar ainda está por lá chefiando a enfermaria. E nós pagando a conta.

Fernando Cavalcanti, 04.01.2010    

HISTÓRIA COM CU NO MEIO...

                    Pensam que foi em Brasília? Não foi. Foi aqui mesmo.              Assumiu a direção de hospital público municipal e, que...