quinta-feira, 28 de março de 2013

L'État c'est moi!


          Como se diz aqui no Ceará, pense num governador corajoso! esse Cid Ferreira Gomes! Por que digo isso?, perguntar-me-ão os amigos mais insípidos e recalcitrantes. 
          Confesso: à suposição da (in)oportuna pergunta, mudei de idéia. Direi que o homem ou é corajoso, ou é absolutamente louco. A coragem é a virtude dos homens de bem, dos homens que se doam, dos homens que têm um ideal. Nada disso é ambição de qualquer político deste vasto rincão. Nos mais de 8,5 milhões de quilômetros quadrados desta terra não há um único político que se preserve o bem, a doação a seus confiantes eleitores e a seus próprios ideais, se baseados neles iniciasse sua ascensão na carreira.
          Um homem de coragem seria também, e por definição, aquele que não tem medo, aquele que não teme. Nesse ponto, sim, o Cid Ferreira Gomes se enquadra. Diz o velho adágio que quem tem cu tem medo. Desculpem-me os letrados e eruditos leitores o uso de expressão tão chula, mas hoje em dia a linguagem, aos que pretendem alcançar o maior número de pessoas, deve se modificar em função da platéia. Pois aí está. Todos entenderão o que acabei de dizer. 
          O governador Cid Ferreira Gomes é, para todos os efeitos e propósitos, e segundo nossas considerações sobre a sabedoria popular, um homem sem cu. Basta que se leiam as reportagens dos jornais locais de ontem e hoje e se constatará minha tese. A de hoje tudo resume. Diz ela o seguinte (http://tablet.opovo.com.br/app/opovo/canais/fortaleza/2013/03/28/4197200/capital-registra-aumento-de-33-em-assassinatos-neste-fevereiro.shtml): "Capital registra aumento de 33% em assassinatos neste fevereiro".  Diz ela também que o anúncio da tragédia vem "um dia depois de o governador Cid Gomes prometer a redução dos homicídios no Ceará até o ano que vem". Os 33 % de aumento ocorreram em Fortaleza. No Ceará o aumento dos homicídios foi de quase 26% entre os dois últimos fevereiros (2012 e 2013).
          Não pensem meus queridos leitores, se é que ainda os tenho - e aqui não pretendo plagiar o Nelson! - que o governador do Ceará seria corajoso por anunciar o que provavelmente não pode cumprir. Em minha humílima opinião o homem é corajoso por um único e mísero detalhe: ele se propõe cumprir a promessa porque "está convencido de que a elevação do número de homicídios tem uma grande relação com as drogas”. Vejam bem: ele "está convencido"! E estamos conversados. Não há aqui nenhuma evidência de que o senhor Governador do Estado do Ceará se baseie em estudos sócio-científicos sérios para chegar a tal conclusão. Ele vai, ao que parece, atacar o tráfico de drogas porque, para ele, é este o grande vilão da história.
          O diabo é que na mesma reportagem apareceu a opinião de um tal de Geovani Facó, coordenador do laboratório de Estudos e Pesquisas da Conflitualidade e Violência da Universidade Estadual do Ceará. Disse ele o seguinte: "Mais grave que o narcotráfico, que é elemento importantíssimo: a população está se matando, os jovens estão se matando, em disputas que são agenciadas pelo narcotráfico, mas não só. Isso passa pelo mundo das drogas, mas passa por outras formas de cultura cotidiana. O cotidiano da cidade está violento" (SIC).
          Só em se apor a opinião de um homem da ciência, e que peita o "convencimento" do senhor governador, já se percebe que há algo de errado. O cientista, em tese, está embasado em dados reais, da pesquisa, colhidos em campo, e que, após trabalhados, levam a conclusões difíceis de refutar. (Observem que não estou a afirmar que a ciência tem sempre as respostas. A ciência tem, cada vez mais, se rendido às evidências da Ciência e da Volição, mas isso é outro tema.)
          Mesmo que a fala do cientista não tenha sido tão clara – talvez ele houvesse entornado uma ou outra –, o governador não deveria emitir opiniões. Deveria, antes, avisar que sua linha de ação a viger contra a violência se apoiará na evidência de suas causas cientificamente demonstradas. Por que não o fez? Porque se acha onipotente e onisciente: tudo sabe e tudo pode. Não precisa de ninguém para lhe dizer onde está a raiz do problema mais sério que enfrenta. Ou melhor: que seu povo enfrenta. Ele tudo sabe, ele tudo vê, ele tudo sente. 
          Pobres de nós!! Quem disse algo semelhante assim? Lembrei: foi o Luís XIV que disse, do alto de sua empáfia, que "L'État c'est moi"! Vejam que vivemos à luz e, por que não dizer?, à escuridão de um Luís XIV borra-botas nascido no Ceará lá pelas bandas de Sobral. (Nem mesmo sei onde o homem nasceu!)
          A reportagem diz ter procurado alguém da secretaria de segurança pública para uma entrevista após a divulgação dos dados sobre o aumento da violência e a ninguém encontrou. Não é de surpreender. Ao ano que vem, após não cumprir a promessa que bisonhamente prometeu, também não se encontrará, para uma única explicação e esclarecimento, o poderoso e onipresente Cid Ferreira Gomes, o nosso Luís XIV. 
          
          


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