"Que coisa adolescente, James Dean"... (Belchior)
Eis que não houve, na última quinta, o clube do Bolinha. A quem não se lembra, relembro que o clube é um espaço reservado exclusivamente para meninos. Disse espaço e corrijo – é um momento reservado exclusivamente aos meninos. (Quem quiser mais detalhes que pergunte às Luluzinhas.)
Eis que não houve, na última quinta, o clube do Bolinha. A quem não se lembra, relembro que o clube é um espaço reservado exclusivamente para meninos. Disse espaço e corrijo – é um momento reservado exclusivamente aos meninos. (Quem quiser mais detalhes que pergunte às Luluzinhas.)
Pois os meninos
avisaram com antecedência: não poderiam comparecer. (Os “meninos” são os
cinquentões.) Foi nesse cenário que o amado Fábio Motta me incitou a
acompanhá-lo ali, em certo barzinho, em duas ou três cervejas. Aceitei
incontinenti. Não podia me dar ao luxo de perder a oportunidade de estar com
tão fugidio amigo.
Era uma hamburgueria, um lugar intensamente frequentado
por adolescentes. E assim me vi, sem maiores considerações, num bar adolescente
a convite do Meninotti, digo, do Fábio Motta.
Vejam que abundam
em nosso anedotário particular as muitas histórias do Meninotti Motta, as
últimas dando conta de sua regressão comportamental. Perguntará alguém
estupefato: – como assim, regressão comportamental? Explico.
Não se sabe
exatamente há quanto tempo o nosso Fábio de Oliveira Motta acordou certo dia e
decidiu: – “quero ser menino outra vez”. Daquele momento em diante, como numa
mágica de Sininho, tudo mudou. Seus ternos mais finos foram arrumados num fundo
de baú e suas gravatas foram doadas a um brechó. As poucas cuecas que ainda
guardava foram cedidas aos filhos da lavadeira. Em pouco mais de quinze dias o
guarda-roupas era outro. Quem o abrisse diria ser o de um garoto de seus
dezessete, dezoito anos. Eis renascido outro Fábio Motta, um obsessivo e
obcecado Peter Pan.
Óbvio é que outras coisas aconteceram até culminar
na constatação da mudança irreversível – o homem agora comia hambúrguer e
cachorro-quente. Antes era churrasco de carnes nobres e até panelada,
sarrabulho e sarapatel. É bem verdade que toma lá umas cervejas, mas... e daí?
Não as tomam também os adolescentes? Mesmo aí há uma alteração radical. Afinal,
o nosso Motta, até seu último dia como adulto, apreciava o chamado “álcool
duro”, isto é, uísque sem gelo. E se lhe punha uma pedrinha seria apenas para
enganar a torcida. Numa noite bebia uma garrafa inteira. Coisa de gente grande,
de gente adulta. O adolescente em que se tornou bebe apenas cerveja. E se lhe
perguntamos sobre o uísque, responde que está levando uma vida saudável, que
dorme cedo e levanta cedo para... surfar. Sim, o Motta voltou a ser surfista,
esporte que praticou durante toda a adolescência. Como o fôlego já não é o
mesmo de há 40 anos, faz aulas de apneia.
Vejam que não saiam por aí a dizer que faço
apologia ao alcoolismo. Não é o caso, acreditem. Meu único propósito é expor as
diferenças entre um Fábio Motta e outro Fábio Motta. Um seria o clássico, o
outro o moderno ou, mais precisamente, o saudoso. O tipo adolescente permanece
intacto desde James Dean.
O que me pergunto até agora é: – que acontecimento
precipitara o novo e improvável Fábio Motta? Eu disse que “certo dia” o homem
acordou e decidiu. Mas... que dia teria sido esse? O que aconteceu àquele dia
ou à véspera? Sininho teria tantos poderes? Seria um amor que se perdeu na
frustração da inviabilidade? Seria a descoberta em si mesmo do homem só, e
sempre só, invariavelmente só? Seria tudo uma espécie de crise da meia-idade? a
insegurança que abate aquele que se vê cara a cara com a velhice e com o
apartamento de todos ou quase todos os laços vitais e essenciais? Ou seria
apenas mais um chiste de meu amigo a se somar a tantos outros?
Passou-me pela cabeça uma doença, sim, um mal
irreversível e inexorável, desses que deformam o indivíduo a ponto de
tornar-lhe irreconhecível ou incapaz, e que lhe impusesse o momento único de
voltar a ser o que amou ser um dia. Por último considerei a maldita, algo
mortal, sentença do inelutável momento... Para felicidade de todos que muito o
amam, não parece ser este o caso. Ele exala a saúde humilhante dos de
excelentes genes. É espécime dos que vivem cem ou mais anos, tudo culpa do Agapito
e de dona Mirtes, seus amorosos e zelosos pais, longevos e vivazes.
Quanto a nós e nossa investigação, tudo tem sido em
vão... Ao que tudo indica, seremos obrigados a conviver com o “Meninotti” Motta
por sabe-se lá quanto tempo, o tempo que durar sua incursão adolescente. Será dureza
ensinar a esse menino tudo outra vez. É tudo o que posso dizer agora. Oportunamente
volto com novidades.
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