Nada quero de quem quer que seja. De ninguém nada quero. Mesmo de meu mais próximo consangüíneo nada quero. Nada peço que se faça por mim. Tivesse irmão gêmeo, um univitelino, dele nada esperaria, nada quereria. E por que não quero? Porque quero que nada queiram também de mim.
Mas qual! Seguem querendo, tudo querendo; sirvo-lhes a vários interesses. E em assim querendo, manipulam-me; mesclam sua cobiça ao eventual sentimento que por mim nutram a fim de me amolecer o coração, como se meu coração não já soubesse toda essa artimanha, toda essa astúcia. Atender ao interesses, eis o que conta, eis o que vale.
Um me quer a pensão perpétua, mesmo já conhecendo onde e como comer, que ameaças evitar, tendo já obtido a força do animal adulto para sobreviver. Atrasa-me o cuidado de minha velhice numa demonstração descarada de ganância e falta de zelo. Sem necessidade. Justifica-se em palavras vãs que minha bagagem bem conhece.
Um outro me quer o amor e o que se resolveu conceber no conceito de "fidelidade". Também esse não me quer saber se estou bem, se estou feliz, se me aflijo ou não e, ainda que me afligisse, não pretende me afrouxar as rédeas até que se lhe garanta seu quinhão. Mesmo que para isso me imolasse, e sofresse, e pranteasse, ainda assim não arredaria o pé. E se lhe confessasse, num concílio franco, abrindo-lhe minha mais pura e essencial verdade, ainda assim me tentaria manipular, sugerindo-me uma culpa que não tenho, ou em demonstrações perfeitas de sua dor e a mim lha atribuindo.
Um terceiro cobra mais caro – quer-me o amor que lhe não dei, tendo eu dado. Porquanto só entenda e conceba seu próprio conceito de "amor", nega-me que o que sinto seja amor. Seu conhecimento fragmentado e também inclemente à satisfação de seus desejos e interesses acaba por excluir a mim mesmo desse amor que a mim pretende dar, enquanto julga-me os sentimentos segundo seu próprio entendimento.
Por que, então, após tanta exclusão de mim mesmo daquilo em que se pretendia ser eu prioridade, deveria eu seguir mansamente? o que me impede a revolta em mim mesmo? Devo consentir em que me julguem segundo seus medíocres tribunais? Fartei-me de minha passividade e de minha permissividade. Minha indolência, justificada a princípio no intuito de me não indispor com quem verdadeiramente amo, chegou ao fim; nem diria ao limite, posto que no limite ainda se consinta algo.
Chegada ao fim minha indolência, exijo a paz, a minha paz; exijo que me deixem, que me abandonem, que não mais me amem e que renunciem à minha companhia em suas medíocres existências. Que pensem em mim doravante como alguém que já desceu à campa, e que jamais verão novamente. Não permitirei que se obstinem como os filhos que mantêm artificialmente um pai apenas para que através daquele moribundo se lhes chegue o objeto de seu interesse. Morra eu antes, metaforicamente ou de fato. Serei doravante o anacoluto nas frases e fases de suas vidas. Que me esqueçam, que me inumem. E anelo a que também desapareçam de diante de mim!
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