Ligou-me o Brasinha, o homem dos fetiches. Vez ou outra me bate o telefone para dois dedos de prosa. Soube do nascimento de meu neto e anelava parabenizar-me. Assim, externou toda a sua felicidade por saber do nascimento de uma linda criança. De fato, a chegada de um descendente de segunda linha é um acontecimento ímpar. (Vejam que segunda linha aqui não traz em si qualquer juízo de valor ou diminutivo. Pelo contrário, o neto é o salto no além e para além da vida de um avô. O mais apropriado termo seria linhagem.) Contudo, Brasinha queria ir além a seu telefonema, o safado.
As fofocas são o conjunto de todo o folclore em torno de um fato. Há na fofoca, que eufemisticamente chamaríamos de boato, uma verdade bem menor que o seu todo. O diabo é que o todo sempre ofusca aquela, de modo que ela se torna um minúsculo grão de areia diante do resto. Pois o Brasinha empertigava-ser por debulhar uma fofoca.
Joguei-lhe uma boa bacia de água gelada. A fofoca que ele queria debater simplesmente não haveria de ser uma fofoca. As fofocas estão além do controle de seus protagonistas, o que nem de longe seria o caso por um simples detalhe: - o próprio autor, eu no caso, cuidou de relatar os acontecimentos tão logo pôde. Alguém dirá que mesmo assim não se pode evitar que se emprestem ao fato detalhes inexistentes e enfeites indesejáveis, e direi que, com efeito, não há como evitar essa interferência. Nesse caso em particular, entretanto, o peixe foi vendido pelo dono ainda fresquinho e cru. Quem quiser lhe apor temperos e pimentas que o faça, mas depois não se reclame que o bicho não agrade ao paladar.
Fez-me uma confissão: - os amigos o estimulavam a escrever uma crônica sobre o referido fato, já que eu por mais de uma vez havia tomado-o como ator numa de suas hilárias histórias. Por duas ou três vezes relatei episódios inusitados protagonizados por ele e que levaram os demais amigos à galhofa. À última vez, lembro-me bem, bateu-me o telefone tão logo leu o relato escrito por mim. Estava deveras preocupado. Temia que sua jovem esposa viesse a tomar conhecimento do texto. Não que seu conteúdo lhe fosse desconhecido. (Ela, a própria mãe e ele foram os principais atores dessa história, uma tragicomédia em três atos cujo desfecho inesperado emprestou-lhe o caráter de hilaridade.) Temia que ela se enchesse de cólera ao constatar que o lastimável evento já ganhasse o mundo. Bem se vê que o tal episódio não foi coisa de que se pudesse orgulhar. Ainda que o acontecimento tenha sido grave, nem por isso foi menos cômico.
Felizmente – para mim, creio – meu querido amigo Brasinha não se achou competente para transformar a história que me vitimou na bela crônica que os outros desejariam ler. Eu, de minha parte, adoraria que ele o fizesse. Afinal, não há do que me envergonhar no episódio do qual fui vítima. Cada doido tem sua mania e não se pode culpar ou responsabilizar a vítima de uma pessoa amalucada. Ademais, o tal fato nada tem de engraçado. Assim, atribuo a desistência de meu amigo em relatá-lo mais por essa razão do que propriamente por sua suposta falta de talento literário.
O que parecia claro em nossa prosa ao telefone era o desejo de meu amigo de que eu soubesse que os outros amigos ficariam muitíssimo satisfeitos se o caso viesse a se converter em arte, ou seja, numa bela crônica. E assim nos despedimos.
Destarte, venho informar aos queridos e saltitantes amigos que estou seriamente a cogitar a possibilidade de eu mesmo deitar ao papel o episódio que tanto os faz sorrir até hoje. E é porque a coisa já se passou há meses. O Sérgio Moura é um deles. Após tomar conhecimento da "anedota", bateu-me o telefone para perguntar se eu não estaria interessado nos serviços dos seguranças do senhor Barack Obama, simplesmente o Presidente dos Estados Unidos da América, em meu dia-a-dia. Dei uma de joão-sem-braço e ele ficou a se abrir na outra ponta do fio. Mas ele não perde por esperar. Logo, logo dar-lhe-ei a pilha de que necessita para suas rotundas e soberbas gargalhadas.
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