Hoje quis me
esconder, me cobrir de lençóis e panos, e me encolher. Hoje quis ser nada, nem
um grão de areia, nem um átomo, nada. Porque queria saber dos amores que nutrem
por mim, me anulei. Quis despir-me de tudo o que me qualifica, de tudo o que
pretendem me engrandecer, de tudo o de valor que me imputam. Se sendo nada me ainda
amassem os que dizem me amar, então verdadeiramente me amariam.
Hoje
quis desenhar em minha face uma máscara odiosa, assimétrica, repleta de imperfeições
e sulcos da marcação do tempo, para que sentissem por mim repugnância e asco. Porque
queria saber dos amores que por mim nutrem, queria me deformar. Quis despir-me de
qualquer traço físico que incitasse por mim atração ou desejo. Se sendo um ogro
ainda me amassem, então verdadeiramente me amariam.
Hoje
quis me desfazer da tralha material que ajuntei na vida, estar nu como quando
vim a ela, estar desprotegido do calor e do frio, sem mesmo uma árvore que me
desse sombra. Porque queria saber do amor com o qual dizem me amar, quis me
empobrecer. Quis tirar de mim, de meu poder, toda matéria que, sendo de minha
posse, me atraísse a ganância dos amores que não amam. Se na mendicância ainda
me amassem, então verdadeiramente me amariam.
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