Vejam vocês como o sujeito
está vulnerável a todo tipo de impropério por parte dos amigos. Inda mais hoje
em dia, ao tempo das redes sociais, onde tudo se publica e tudo se divulga, o
sujeito em casa nem sabe o que se está a ventilar a seu respeito. Se não se
ligar às redes ficará mais alienado que cachorro com dor de dente. (Suponho que
já tenham visto um cachorro com dor de dente.)
Dito isso, passo a relatar o
que me ocorreu em espaço de tempo menor que a prenhez de uma Escherichia coli.
Foi precisamente o seguinte, tudo escancarado na rede social. Antes, porém, um
breve comentário referente a uma curiosidade vernacular no ambiente da rede
social, e envolvendo seu próprio nome. Outro dia eu comentava que
nós brasileiros somos, em tese, uma nulidade em matéria de ciência. Nada
descobrimos, nada inventamos, nenhuma descoberta científica fizemos que mudasse
a face do planeta. Os ufanistas, discípulos do já antigo Policarpo Quaresma,
hão de me jogar enormes paralelepípedos citando Santos Dumont e seu 14 Bis e direi
que há controvérsias. Vide a história dos irmãos Wright. Não minto. Pois também
a rede social não é invenção de brasileiro, e por isso mesmo seu nome não se
pronuncia em português.
Há até o filme a contar a história dos garotos que a criaram.
Eles são brancos, loiros e falam inglês. Dito isso, e sem saber por
que o disse, relato o fato.
Uma querida amiga escancarou
na rede social a sua cruel e implacável insônia. Não conseguia dormir. Há sei
lá quantas noites não dormia. Sua frustração era tão intensa que não lhe restou
outro remédio que não fosse difamar seu algoz, a insônia. Tornou-se, naquele
exato momento, a insônia mais difamada de que se tem notícia. Tão execrada foi
a insônia de minha amiga que temo que ela, a insônia, a processe por calúnia.
Mas o fato é que estava lá na rede social a mais pública insônia de todos os
tempos.
Minto. Houve na rede social,
recentemente, uma outra exposição pública ainda mais notória e excrescente: a
de uma cólica menstrual. Melhor dizendo, não foi uma cólica menstrual – foi uma
tensão pré-menstrual, a conhecida TPM. Uma outra amiga a levou a público
tamanho o sofrimento que a tal cólica – fiquemos com esta por ser, ao que
parece no caso de minha amiga, o sintoma cardinal de sua TPM – lhe trazia.
Queria, como a primeira amiga, caluniar a miserável da cólica. E fez pior –
fotografou a cólica. Imaginem os senhores a foto de uma cólica. Muitos a viram.
Estava, na rede social, como o cadáver do gato à beira da estrada após o
atropelamento. E, se querem mais detalhes, lhes adianto – foram, na verdade,
inúmeras fotografias a compor um desses painéis que muitos adolescentes têm em
seu quarto de dormir. A cólica foi fotografada em todas as posições – em pé, em
decúbito dorsal, em decúbito ventral, de lado, com o travesseiro entre as
pernas, com o travesseiro na barriga, com um lenço a cobrir-lhe os olhos, e
assim por diante. O quadro era tão dantesco que cheguei, eu mesmo, a sentir a
cólica a me importunar. Ela ganhou até nome – alcunharam-na de "amostra
grátis de parto". Por aí se tem uma idéia do drama.
Mas – ainda sobre a cólica,
que a esta hora deve estar a consultar seus advogados – há pior, como diria o
Nelson. Quase duzentas outras cólicas se apressaram a comentar a de minha
amiga. Foi uma tempestade de cólicas a se solidarizar com aquela, fato que me
faz supor que um eventual processo por difamação e calúnia há de ser
considerado como um "mau direito" da parte da cólica ultrajada em sua
privacidade violada.
Voltemos à insônia caluniada
de minha primeira amiga. Um amigo, na tentativa de ajudá-la, sugeriu
escancaradamente na rede social, e já armando o bote pra mexer comigo, que ela
procurasse a minha ajuda. Ela respondeu: -"Esse aí tá mais pra causa que
pra cura de insônia!" Confesso: pus-me a gargalhar na rede social. Sim!, hoje
é possível se gargalhar na virtualidade e na rede social! Foi realmente muito
divertida e espirituosa a tirada de minha amiga, própria dos de inteligência
aguda e digna de elogio, não fosse por um detalhe: expôs-me na rede social.
Fiquei tal qual sua insônia e tal qual a cólica da outra donzela – difamado e
caluniado.
Minha amiga, que exerce a
nobre profissão dos causídicos, bem sabe que eu poderia levá–la às barras da
justiça por tão engenhosa e gostosa pilhéria. Entretanto, como me bem conhece e
sabe que me dou melhor com o falso vitupério que com o falso elogio, presume
acertadamente que nem de longe teria a intenção de agir nesse sentido. Afinal,
aos amigos tudo é permitido. É o "ônus" que se paga para tê-los.
Nenhum comentário:
Postar um comentário