Outro dia encontrei minha querida amiga Jesoni Gruska no edifício garagem do Hospital Geral. Estava eu tirando as luvas. Ela percebeu que era equipamento de motociclista. Perguntou: -"Não tem medo de andar numa motocicleta?" Respondi "de bate-pronto": -"Me pelo de medo, amiga!" E completei: -"Mas a coragem é maior que ele."
Poderia ter estendido um rosário de argumentos, reflexões, idéias, noções, conceitos, mas calei. Quando se faz assim, tem-se a nítida impressão de que se está a tentar "catequizar" alguém em sua própria e individual concepção sobre algo. Não me disponho a tal. Até porque é extremamente difícil, se não impossível, tentar convencer alguém que a motocicleta é um veículo que pode, sim, ser seguro.
Contudo, ainda não a deixei ir sem antes lhe dizer que é bom o medo, que é bom ter medo. E lhe disse mais, quase filosófico: -"Tenha medo do homem que não tem medo!" E ela partiu a se rir de mais uma de minhas idiossincrasias.
Pensemos bem: o que faz o medo? Das duas, uma: ou paralisa, ou leva à reflexão. Na primeira hipótese o medo é mau porquanto limita o ousar; ousar é usar da coragem, é atrever-se a algo, é se permitir ultrapassar o limite do lugar-comum. Se hoje voamos, por exemplo, é porque os corajosos ousaram, venceram o medo que não os paralisou. É mau, portanto, o medo que paralisa quando a experiência pode ser recompensadora.
Na segunda, o medo leva ao aprendizado, porquanto a reflexão é um "pensamento sério ou meditação profunda a respeito de determinado assunto ou problema". Se estamos a pesquisar sobre determinado assunto, o estudamos a fundo a fim de aprender o máximo sobre ele. Daí ser comum se ter medo do que se não conhece.
Assim, o homem que não tem medo ousa se aventurar em terreno desconhecido pondo em risco a si mesmo e a outros. Tal espécie de homem comete o erro capital, e às vezes mortal, de pensar que já tudo sabe, que nada lhe restou a ser aprendido, atitude cediça entre os mais jovens. Se já tudo sabe sobre tudo, não vê o que há para ainda aprender. Age, então, baseado em preconceitos pessoais. Diz o Robert Kiyosaki sobre investir: "Não é o investimento que é de risco, mas o investidor, se não sabe o que está fazendo". O mesmo se pode dizer quanto a correr riscos em outros cenários.
O conhecimento que se adquire numa atividade ou "ação" de risco serve a minimizar ao máximo esse risco. Assim, no caso específico de se pilotar motocicletas, como não há anteparos ou proteção nenhuma para o corpo do piloto, deve ele pilotar com cautela elevada à decima potência. Então, a pergunta que se faz é: como elevar a cautela a tais níveis? Ou: há ainda algo que não sei e que possa ser feito para elevar a segurança? Resposta: sim, há muitas medidas a serem adotadas. Porá em prática e tornará elas um hábito o motociclista que tem medo.
Vejam que o motociclista pensar em segurança apenas eventualmente é uma perigosa armadilha a ser destacada. Segurança aqui obedece à lei do tudo ou nada. Ou, ainda, pensar em segurança em 100% do tempo em que se está pilotando é a regra de ouro. Diria mais – o verdadeiro e consciente motociclista começa a pensar em segurança antes mesmo de subir à máquina. Por isso não se deve condescender com mínimas estripulias que sejam como, por exemplo, andar na contra-mão ainda que por dez metros, ou ir até a esquina sem o capacete, ou ainda pilotar após um gole na cerveja.
Andar em alta velocidade é a "manobra" mais mortal a que o motociclista, que nessa instância chamo de "motoqueiro", se expõe. As razões para isso são tão óbvias que me absterei de comentário adicional. Abrir a guarda para tais maus hábitos é negociar com a sorte e, nessa seara, a sorte não é uma variável desejável nem confiável. O indivíduo que está em alta velocidade numa motocicleta está procurando provar que a sorte é o encontro do preparo com a oportunidade – está na velocidade e no lugar certo para morrer.
Excelente colocação.
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