Há anos venho afirmando: -"Não leio jornais!"
Contudo, estou a descobrir aos poucos o que a mim me parecia inusitado – os jornais locais são uma fonte perene de piadas e bom humor. Humor negro, é verdade, mas ainda humor, daqueles que nos levam a rolar ao chão de tanto rir. Vejam que outro dia comentei sobre matéria do jornal Diário do Nordeste que "denunciava" a penosa situação dos jovens diabéticos que dependem do governo para se tratar. As justificativas dadas pelo secretário de estado para a falta de tudo a que os doentes têm direito são de uma hilaridade medonha.
Ontem e hoje fomos agraciados com mais uma pantomima de nossos homens públicos, exposta naquele mesmo Diário. Perceber o poder cômico de nossos matutinos tem sido, para mim, uma alegria e surpresa sem tamanho. Evito-lhes, confesso, a seção policial, que lá o humor não poderia ser mais negro. A seção de política, acreditem, é imbatível em comicidade; e não me queiram provocar com as colunas sociais. Essas são de matar de rir.
Ontem o senador petista José Pimentel anunciou em alto e bom som, em reportagem do referido periódico, que "recursos do governo federal destinados ao Ceará para a realização de obras importantes estão sendo devolvidos à União porque as prefeituras cearenses e o governo estadual não estão regularizando e viabilizando os projetos". E saiu o senador a dar vários exemplos de projetos que estão parados em sua concretização porque "não estamos fazendo nosso dever de casa". (Diário do Nordeste, pág. 13, 15/02/2012)
Hoje, como seria de se esperar em se tratando de um Ferreira Gomes, o governador Cid, que é do PSB, veio à boca de cena rebater o que disse ontem o senador. Disse que ele "no afã de defender o governo federal, como eu defendo, extrapolou, exagerou e mentiu". Disse o governador à reportagem que teria dito ao senador – numa conversa pessoal ou por telefone de ontem para hoje, não ficou o claro – o escrito que lera em para-choque de caminhão: "Para tua estrela brilhar não precisa apagar a minha".
Percebam que o chefe do executivo ressaltou que ambos, o senador e ele próprio, defendem o governo federal. Afinal, seus partidos são aliados no Ceará e na esfera federal. Em outras palavras, o governador deve ter ficado indignado com o fato de um senador da república, que seria supostamente seu aliado, estar "denegrindo o governo e as prefeituras do Ceará". E tudo, segundo o governador, para brilhar mais. Seria o senador um meninão que quer se sobressair, perante Brasília, batendo em quem supostamente não está fazendo o que deveria fazer. Seria o chamado "fogo amigo".
O governador, então, tentou demonstrar que o senador está mentindo usando os mesmos exemplos que ele usou, projetos que estão, sim, regularizados e viabilizados na parte que toca seu governo. Assim, confirmou: José Pimentel estaria mentindo. Disse mais: que a fala do senador soava como uma declaração de guerra ao palácio da Abolição, sede do governo, e que ele, governador Cid Gomes, seria o derradeiro sustentáculo da aliança entre seus partidos. Vejam que há aí um discurso implícito, recado subentendido. Que será dessa aliança daqui pra frente?
Que políticos mentem, todos sabemos. Devem se lembrar do galã Bill Clinton, quando afirmou categoricamente sobre Monica Lewinski: -"Não conheço esta senhora!" E o que dizer do senhor George W. Bush? que invadiu o Iraque nas "melhores" das intenções em busca de armas de destruição em massa que nunca foram encontradas? E aqui mesmo, entre nossos políticos, que nunca sabem de nada do que fazem seus asseclas e cupinchas. São completamente alienados do que ocorre à sua volta. São mesmo? ou são uns mentirosos de carteirinha?
Pergunto, sobre a questiúncula envolvendo o governador e o senador: quem desses senhores está mentindo, afinal? O governador não quer ver minimizado o brilho de sua estrela, que a ele lhe parece de primeira grandeza, uma Antares fantástica. Julga-se, como se diz por aí, a bala que matou o Kennedy. Bem conhecida é a arrogância desses senhores da mesma família.
O senador, que hoje veio a público via outros noticiosos, afirma que tentava apenas ajudar e chamar a atenção para os deslizes do executivo. Falando assim deixa claro nas entrelinhas que não retira o que afirmou na reportagem inicial que deu ensejo a esse bate-boca de comadres.
Na Assembléia Legislativa do estado oposição e situação discursavam sobre o solo pétreo da "verdade" de cada um dos contendores. Cada lado partia do princípio da verdade absoluta do que dizia seu líder. Ninguém queria saber da verdade verdadeira, pelo visto.
Dentro de todo o cenário – governador vaidoso, senador "aliado" língua frouxa, deputados estaduais oportunistas, para-choque de caminhão de referência e estrelas que pretendem se ofuscar mutuamente – admitamos: é tudo muitíssimo engraçado. Pena que também seja trágico.
Enquanto não aparece a verdade, aguardamos cenas do próximo episódio. O lamentável é que estejamos às portas do carnaval e as bocas próximas a se deixar calar para o período momino. Ou entrarão a guerrear mesmo assim?
***
José Martins entrou no consultório para uma revisão comigo. Não lhe queiram saber da doença, que este é assunto de foro íntimo do paciente. Estou sendo fiel ao Juramento. Ele me impele à discrição. Nós cearenses somos muito curiosos nesses assuntos, assuntos da vida alheia. Paremos com isso.
Ele é de Pacajus, isso posso contar. Ao final do ato médico lhe perguntei: -"E por lá? como vai a política?" Respondeu, debaixo de seu largo chapéu de palha de vaqueiro: -"A política tá boa!..." E emendou numa naturalidade atroz: -"O prefeito tá preso, o senhor sabe."
Foi assim. O prefeito começou com uma fazendinha que abrigava apenas 14 reses. Pouco antes de ser engaiolado seu rebanho já contava 10 mil cabeças de gado bovino – 6 mil vacas e 4 mil touros. Devia ter lá uns cavalos, carneiros, ovelhas... A fazenda já não era a mesma. Era outra, bem maior, sei lá quantos hectares.
Como pecuarista, vendia seu leite a um comerciante "aliado" a quem ele comprava o mesmo leite de volta, para as escolas e creche do município, desta feita como prefeito. Em outras palavras: o fazendeiro que por acaso era prefeito vendia seu leite ao prefeito que por acaso era fazendeiro – era a mesma pessoa vendendo e comprando o mesmo leite. E o preço? Oito reais por litro de leite. (Assim até eu fico rico.)
Ele diz até hoje em sua defesa que não sabia que estava comprando dele mesmo, e inventou uma novidade para tentar ser solto – se faz de doido. Os munícipes propagam aos quatro cantos que ele, coitado!, teve um derrame. Ele não mais fala e só se comunica por gestos e movimentos. Essa, sim, é a verdadeira pantomima!
O texto merece ser publicado no caderno Politica dos nossos jornais.Tá ótimo.
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