Já
se escreveu que “a história é a ciência da infelicidade dos
homens”; nosso século de violência parece confirmar essa fórmula
de maneira eloquente. É verdade que nos séculos precedentes poucos
povos e poucos Estados estiveram isentos da violência de massa. ...
Não
resta dúvida de que, a esse respeito, nosso século deve ter
ultrapassado seus predecessores. …
O
comunismo insere-se nessa faixa de tempo histórico transbordante de
tragédias, chegando mesmo a constituir um de seus momentos mais
intensos e mais significativos. …
Qualquer
que seja o grau de envolvimento da doutrina comunista anterior a 1917
na prática do comunismo real, foi este quem pôs em prática uma
repressão metódica, chegando a instituir, em momentos de grande
paroxismo, o terror como modo de governo. Isso faz com que a
ideologia seja inocente? …”na verdade, as revoluções são como
as árvores, elas são reconhecidas através de seus frutos”. …
Excedendo
os crimes individuais, os massacres pontuais, circunstanciais, os
regimes comunistas erigiram, para assegurar o poder, o crime de massa
como verdadeiro sistema de governo. …
Nenhuma
das experiências comunistas, populares durante algum tempo no
Ocidente, escapou a essa lei. …
Ora,
os crimes do comunismo não foram submetidos a uma avaliação
legítima e normal, tanto do ponto de vista histórico quanto do
ponto de vista moral. …
Os
crimes que expomos neste livro não se definem em relação à
jurisdição dos regimes comunistas, mas ao código não escrito dos
direitos naturais da humanidade. …
A
história dos regimes e dos partidos comunistas, de sua política, de
suas relações com as sociedades nacionais e com a comunidade
internacional não se resume a essa dimensão criminosa, ou mesmo a
uma dimensão de terror e de repressão. Na URSS e nas “democracias
populares” depois da morte de Stalin, na China após a morte de
Mao, o terror atenuou-se, a sociedade começou a retomar suas cores,
a “coexistência pacífica” – mesmo sendo ainda “uma
continuação da luta de classes sob outras formas” – tornou-se
um dado permanente da vida internacional. Entretanto, os arquivos e
os testemunhos abundantes mostram que o terror foi, desde sua origem,
uma das dimensões fundamentais do comunismo moderno. …
Abandonemos
a ideia de que tal execução de reféns, tal massacre de
trabalhadores revoltados, tal hecatombe de camponeses mortos de fome,
foram somente “acidentes” conjunturais, próprios a tais países
ou a tal época. O nosso método...considera a dimensão criminosa
como uma das dimensões próprias ao conjunto do sistema comunista,
durante todo o período de sua existência.
O
comunismo cometeu inúmeros (crimes): inicialmente crimes contra o
espírito, mas também crimes contra a cultura universal e contra as
culturas nacionais. Stalin ordenou a demolição de centenas de
igrejas em Moscou; Ceaucesco destruiu o coração histórico de
Bucareste para construir edifícios e traçar perspectivas
megalomaníacas; Pol Pot fez com que fosse desmontada pedra por pedra
a Catedral de Phnom Penh e abandonou à selva os templos de Angkor;
durante a revolução cultural maoísta, tesouros inestimáveis foram
quebrados ou queimados pelos Guardas Vermelhas. Entretanto, por mais
graves que tenham sido essas destruições, a longo prazo, para as
nações envolvidas e para a humanidade inteira, em que medida elas
pesam em face do assassinato em massa de pessoas, de homens, de
mulheres, de crianças?
Portanto,
consideramos apenas os crimes contra as pessoas, os que constituem a
essência do fenômeno do terror. Esses respondem a uma nomenclatura
comum, mesmo que tal prática seja mais acentuada neste ou naquele
regime: execução por meios diversos – fuzilamento, enforcamento,
afogamento, espancamento e, em alguns casos, gás de combate, veneno
ou acidente de automóvel; destruição pela fome – indigência
provocada e/ou não socorrida; deportação – a morte podendo
ocorrer no curso do transporte (em caminhadas a pé ou em vagões
para animais) ou nos locais de residência e/ou de trabalhos forçados
(esgotamento, doença, fome, frio). O caso dos períodos ditos de
“guerra civil” é mais complexo: não é fácil distinguir o que
decorre do combate entre poder e rebeldes e o que é massacre da
população civil.
Contudo,
podemos estabelecer os números de um primeiro balanço que pretende
ser somente uma aproximação mínima e que necessitaria ainda de uma
maior precisão, mas que, de acordo com estimativas pessoais, dá uma
dimensão da grandeza e permite sentir a gravidade do assunto:
-
URSS: 20 milhões de mortos;
-
China: 65 milhões de mortos;
-
Vietnã: 1 milhão de mortos;
-
Coreia do Norte: 2 milhões de mortos;
-
Camboja: 2 milhões de mortos;
-
Leste Europeu: 1 milhão de mortos;
-
América Latina: 150 mil mortos;
-
África: 1,7 milhão de mortos;
-
Afeganistão: 1,5 milhão de mortos;
-
Movimento comunista internacional e partidos comunistas fora do
poder: uma dezena de milhões de mortos.
O
total se aproxima da faixa dos 100 milhões de mortos. …
Nosso
propósito aqui não é o de estabelecer uma macabra aritmética
comparativa qualquer, uma contabilidade duplicada do terror, uma
hierarquia da crueldade. Entretanto, os fatos são tenazes e mostram
que os regimes comunistas cometeram crimes concernentes a
aproximadamente 100 milhões de pessoas, contra 25 milhões de
pessoas atingidas pelo nazismo. Essa simples constatação deve, pelo
menos, provocar uma reflexão comparativa sobre a semelhança entre o
regime que foi considerado, a partir de 1945, como o regime mais
criminoso do século e um sistema comunista que conservou, até 1991,
toda a sua legitimidade internacional e que, até hoje, está no poder
em alguns países, mantendo adeptos no mundo inteiro.
(A ser continuado.)
Nenhum comentário:
Postar um comentário