Deixemos de instigar querelas. Um amigo me escreveu para dizer que
minhas “análises” sócio-políticas são limitadas; são
destituídas de “fôlego teórico”. E, ao final, fuzilou:
-“Abestado!” Pode? Chamou-me de “abestado”! Que coisa
pavorosa!
Não faço análise sócio-política de nada. Apenas reflito e ponho
à pena. São incômodos da alma que o amigo teima em assim não ver.
Que posso fazer? Vai ver sou mesmo “abestado”. Vale ressaltar que
o referido amigo é comunista; ou melhor, é lulista. Pensando mais
seriamente, é uma coisa e outra. O que ele não percebeu ainda é
que o homem não é comunista e, sim, populista. Casou com o
capitalismo, mas o discurso é claro: serve a enganar a torcida. É o
resultado de sua leitura de Nicolau Maquiavel. O meu amigo, de sua
parte, é comunista, mas consome produtos produzidos no capitalismo,
que ele detesta. Também não cogita migrar para Cuba, que eu saiba.
Eu, se fosse comunista e detestasse o capitalismo, já há muito
estaria vivendo em Havana, dirigindo um daqueles táxis caindo aos
pedaços e me negando a receber as gorjetas em dólar que os gringos
me oferecessem. E estaria feliz porque seria pobre igual a todos os
outros pobres: uma sociedade igualitária e justa. Fico aqui
matutando no porquê de meu querido amigo ainda viver aqui. Custa-me
entender.
Para encerrar o episódio, comparou-me ao Temístocles de Castro e
Silva, conhecido comentarista político local de nítidas cores
capitalistas. Eu quase tenho um troço. O homem é feio demais!
Pedi-lhe encarecidamente que desse em mim uma boa olhada. Sou até
bem apessoado. Até agora ele não me respondeu. Deve estar olhando
as fotografias do Temístocles no jornal, procurando nelas algum
traço meu. Tenho arraigada esperança de que nada ache.
De que falo, então? Do imposto de renda? Da crise econômica
mundial? Outro amigo, que encontrei hoje no hospital, puxou-me ao
canto da sala para dizer que via alguma amargura a me consumir nas
entrelinhas de meus textos. Vejam o título que dei aos últimos
escritos. Não se pode supor que se está para ler uma prosa poética
sob o título de “cotidiano”. Tranquilizei-o. Nada me amargura
no momento, e é pouco provável que haja algo capaz de fazê-lo. O
que é amargo é o dia-a-dia. O que é amargo é a vida. Sábio é
aquele que lhe põe doce como tempero, cores como painel e música
como enredo. Escrever sobre o que vai à vida redunda nisso: o
escritor põe a cara à tapa. Parece que ele é o repositório dessa
tralha toda. Portanto, se há mais alguém a provar da acidez do que
tenho escrito, alerto: não caiam nessa tola armadilha. A máxima é
rir-se de nossa própria desgraça.
O mesmo amigo considerou também que meus textos são “longos”.
Disse ele: -“Não escreva textos longos, senão ninguém lê”.
Ora, quem escreve lá está preocupado com o tamanho dos textos! Não
dá a mínima. Quem escreve quer ser lido, mas não por esse viés.
Pelos auditivos e sinestésicos nada posso fazer.
O fato é que, após tantas reprimendas de todos os lados, ficaram
esses dois encontros - um virtual, o outro real – como os maiores
acontecimentos do dia. Nada de maior importância achei como base
para escrever. E vejam que um de meus amigos ficará satisfeito: o
texto vai bem pequenininho. O outro...
Bem, o outro há de me perdoar a insistência nessas coisas de
modelos econômicos e política. E peço que não venha a propalar
aos quatro ventos que meus tratados em economia e política são
demasiado fracos e inconsistentes. Para isso o encaminho às teses do
Paul Krugman e às memórias do Roberto Campos. Eu escrevo porque sou
enxerido.
Fernando Cavalcanti, 31.03.2009
Nenhum comentário:
Postar um comentário