quarta-feira, 26 de fevereiro de 2025

ENTRE FATOS E FLATOS

Diz o Amorim que os maiores prazeres são os carnais. E, dentre estes, três seriam os maiores, os mais prazerosos de se ter. Os outros seriam prazeres como qualquer prazer, mas não tão intensos quanto aqueles. E, mais ainda, os três maiores prazeres carnais teriam que ser sentidos numa determinada ordem, numa determinada sequência. Dessa forma eles gerariam um prazer maior do que se fossem sentidos isoladamente, sem a sequência ou o compartilhamento dos outros.

                Sua teoria era que o sujeito que não tem os prazeres carnais mais primitivos não pode também ter saúde mental e boas ideias, nem viver feliz e sorrindo. Entenda-se: Amorim jamais leu Freud, ou Jacques Lacan, ou Charles Melman. Creio até que nunca ouviu falar desses caras. Pois bem. Diz ele que os três maiores prazeres são foder, comer e dormir, necessariamente nesta ordem. O sujeito chegar a essa conclusão sem nunca ter lido Freud ou um de seus discípulos é um gênio, quero crer. Em suma: é um gênio esse Amorim! Freud dizia que a origem maior das inadaptações humanas à vida social é a repressão dos desejos.

                Os senhores já devem ter passado pela constrangedora situação de necessitar/desejar urgentemente fazer cocô e ter que reprimir o ato. Quem consegue raciocinar ou fazer qualquer outra coisa diante desse cenário? Ninguém. A repressão desse desejo nos torna agressivos, absortos, inquietos, nervosos, incapazes. Nada naquele momento é mais urgente: cagar é imperioso! Nem foder é possível nesse instante. Não me levem a mal.

                Não falo de luxúria. Nem de disenteria. Nem de polifagia. Falo do comum. Eventualmente todos têm desejos inadiáveis, intransponíveis, intocáveis e irretocáveis. O que eu quero dizer é que uma boa e grande mijada quando se está com a bexiga cheia é um prazer impagável. Alguém receberia dinheiro para não mijar estando com a bexiga do tamanho duma bola de basquete? Impossível. Não sei se me entendem. Não me levem a mal, repito. O safado do Amorim acha que uma boa trepada seguida de uma lauta refeição – digamos, um filé ao molho Parnasse – e uma boa soneca para completar é o céu na terra. Se lhe dermos pilha vai dizer que antes da soneca há que se dar uma senhora cagada regada a umas boas mijadas, à distância da companheira, é claro.

                Na teoria do Amorim, os prazeres dejetórios seriam uma moldura, um complemento, aos maiores prazeres do sexo, da culinária e do descanso inocente. Mas não são menos importantes, porquanto são fundamentais e necessários. São tão importantes esses prazeres dejetórios que, segundo ele, o sujeito que sofre de prisão de ventre, incontinência fecal e urinária e disúria não pode ter boa saúde mental, já não tendo a física. O sujeito pode até ter lá suas varizes que não se importará. Não lhes dará a mínima. Elas não lhe tiram nem lhe obstam os prazeres primitivos, exceto para as mulheres cuja vaidade é um dos prazeres quase carnal, e não é destes que estamos a falar. Haverá coisa mais prazerosa do que cagar mijando e peidando? Só foder, comer e dormir, nessa ordem.

                Amorim encerra sempre sua preleção sobre esses assuntos dizendo: – Cuidado! Se o sujeito se mostrar complicado, neurótico, difícil, porra louca, inadaptado, arredio, isolado, sisudo, triste... ele esconde algo. Está reprimindo alguma coisa. Pode até ser um peido!

 

Por Fernando Cavalcanti, 24.04.2008 

domingo, 9 de fevereiro de 2025

HISTÓRIA COM CU NO MEIO...

                   Pensam que foi em Brasília? Não foi. Foi aqui mesmo.

            Assumiu a direção de hospital público municipal e, querendo tomar pé da situação, pediu à administradora vista do organograma. Tudo parecia dentro dos conformes quando deu de cara com um cargo de chefe da enfermaria, coisa que nunca existira naquela casa. Era um tal de Alberto, doutor Alberto. Perguntou quem seria e descobriu sua amizade de infância com o premier do município, que o tratava por “Beto” ou “Betinho”.

            Beto quase não punha os pés no hospital. Tinha duas situações na casa – uma como plantonista na emergência, outra como chefe da tal enfermaria. Como plantonista teria uma carga horária de vinte e quatro horas dividida em duas de doze, das quais só cumpria seis – e durante o dia. Como chefe da enfermaria não trabalhava. Afinal, nunca se precisou desse tipo de chefe por lá.

            Não teve conversa – mandou chamar o doutor Beto. Sem muitos dedos, deu-lhe duas alternativas: ou cumprisse a carga dos plantões, ou continuasse com as seis horas, vindo ao hospital três vezes na semana resolver as pendências da enfermaria.

            - Rapaz, faz isso comigo, não. Sou amigo do homem, ele me colocou aqui.

            - Tem jeito, não. Ou uma coisa ou outra. Pensa aí e depois me diz.

            Um mês depois mandou novamente chamar o Beto:

            - Vai dar, não. Sem condição.

            - Então vou ter que abrir um processo administrativo aqui, rapaz.

            - Pode abrir – retrucou Beto numa tranqüilidade budística.

            Abriu-se o processo com todos os efes e erres – funcionário relapso, não cumpre a carga horária, não comparece aos plantões, gasto de dinheiro público, etc. etc. etc. E o negócio seguiu os trâmites.  

            Dias depois bate o telefone do diretor. Era o secretário de saúde.

            - Fulano, há quanto tempo! Aparece qualquer dia pra gente bater um papo! Como vai o hospital? E tal e coisa, e coisa e loisa, pa-rá-rá, pê-rê-rê...

E, um monte de firula depois:

- Rapaz, estou recebendo aqui o processo do Beto. Não leve a mal, mas faz assim – não mexe com ele, não. O homem é amigo de infância do prefeito, meu chapa.

O diretor calado permaneceu. O outro continuou:

- Jogavam bolinha de gude, futebol de botão, pelada em terreno baldio, brincavam de esconde-esconde... Deixa ele no lugar dele. O homem já ligou enchendo o saco...!

Dois meses depois o diretor perdeu o cargo. O Beto? Se brincar ainda está por lá chefiando a enfermaria. E nós pagando a conta.

Fernando Cavalcanti, 04.01.2010    

O ANIVERSÁRIO DA MULHER DO AMORIM

  Eis que um dos Mesquita me bate o telefone e me convida a ir ao aniversário da mulher do Amorim, que é Mesquita. Não sei se me leu a últim...