– O senhor poderia, por favor, me ajudar aqui?
Ela tentava colocar alguma coisa talvez pesada na mala do carro. Ele
vinha passando na calçada no caminho da praça para sua caminhada matinal. –
Perfeitamente, respondeu ele já segurando a carga com ela na tentativa de
ajudá-la. Resolvido o imbróglio, disse em tom de brincadeira: – E se me chamar
de “senhor” novamente, a chamarei de “senhora”. Ela sorriu e ele seguiu seu
caminho.
Teria ela lá seus 30 anos, no máximo. Ele, sessentão, sentia o impacto
do envelhecimento amplamente e inegavelmente reconhecido e, pior, abertamente divulgado
na crudelíssima palavra “senhor”.
Sim, fosse vinte anos atrás seria mais ou menos assim: – “Você” poderia
me ajudar, por favor? Mas aí vieram os fios brancos. E depois deles as mechas.
Sim, mechas são uma desgraça! Com elas só vai na base da tinta. Ou do xampu
próprio. Pensava: “Mas... será?” E as rugas? Sim, a cara cheia de linhas
verticais, horizontais, oblíquas, tortuosas... Aí a coisa ficaria mais
complicada, coisa pra botox, operação, produtos pra maquiar...
Noutra ocasião não contou pipocas. Foi na academia de ginástica. O
jovem, teria lá seus vinte e cinco, trinta, se aproximou e perguntou: – O
senhor está usando a máquina? Ele foi direto: – Não, senhor. Fique à vontade. O
outro nem ligou, não deu o mínimo sinal de incômodo. Subiu na máquina e começou
a se exercitar. Começou a pensar: “Ué... ele não se importou... não deu a
mínima”! E, ato contínuo, concluiu que o problema havia de ser as mulheres. Sim,
as mulheres, por via das dúvidas, punham os “senhores” em seus devidos lugares
logo de cara, na mesma hora, sem deixar brecha para coisa nenhuma.
Ora, mas não estaria sendo demasiado cabeça oca? Estaria tomando por
menos atitudes respeitosas que as pessoas teriam com qualquer um, de quarenta,
cinquenta sessenta anos, não importa. Mas não poderia negar o incômodo de ser
chamado de “senhor”, ora essa!
Noutra ocasião, novamente na academia onde faziam ginástica uma penca
de pessoas mais velhas, ao chegar cumprimentou Mazé, uma mulher mais velha que
ele: – Bom dia! Como vai a senhora? Ela, muito espirituosa e brincalhona,
respondeu sorrindo: – Estou bem, mas a senhora está no Céu! A risada foi geral.
Ele, exultante, pensou: “Tenho uma cúmplice!” Ela completou: – Não me chame de “senhora”,
caso contrário não respondo pelos meus atos!
Desde então na academia é um negócio de “você” pra lá e pra cá danado,
todo mundo se sentindo na flor da idade. E põe idade nisso! E concluíram: aqui
ninguém é velho – são todos de “segunda mão”!
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