terça-feira, 4 de outubro de 2016

MINHA INTUIÇÃO ME DIZ QUE NÃO...

            Confesso: procurei exaustivamente – escrutinando currículos, histórias e estórias – um candidato a prefeito que preenchesse aquilo que considero o mínimo necessário para exercer o cargo. Ora, mas quem sou eu? Nada sou, eis a verdade. Sou apenas mais um mísero eleitor em meio a esse caos de ideias e de pretensões individuais e, quem sabe, de pretensões coletivas.
            Confesso ainda mais: não assisto à propaganda política de nenhuma espécie. Perguntar-me-ão, então, como teria sido essa procura. Diria que me utilizo, principalmente, dos fatos e da intuição nesta penosa busca. Haverá alguém que dirá que a intuição não é uma boa conselheira, ou que a intuição não se vale de dados concretos, ou o que quer que seja que tente diminuí-la como ferramenta de escolha e decisão. Alguém já disse, acho que um financista, que “a intuição é, na verdade, um monte de conhecimento acumulado que fica escondido”. Então, eis aí tudo: utilizo-me do conhecimento escondido que tenho. (Se bem me lembro, disse também o financista que esse conhecimento nos fica escondido no subconsciente, ou onde quer que nos caiba na mente, ou sabe-se lá onde. Entretanto, não há que duvidar – ele está lá.)
            Ainda assim, não nos prendamos tanto a ela. Fiquemos com os fatos contra os quais, como diz o chavão, não há argumentos. Há contra os fatos apenas uma, e somente uma, inconveniência – sua abundância. Sim, abundam os malditos fatos. São tantos, e tantos, e tantos que quase desisto de continuar. Escolhamos, assim, uns poucos deles para seguir nessa tentativa de explicar meus critérios na procura deste ser etéreo que é o candidato a político. (Notem que alguns candidatos, a maioria quero crer, já são políticos, ao passo que outros estão se candidatando precisamente a isto – a ser político. Este último estará se aventurando pela primeira vez. Evitemos entrar a falar do que dizia Aristóteles sobre ser o homem um animal eminentemente político, que a coisa pode ficar muito complicada.)
            Há, nesta cidade, uma penca de fatos... ou melhor, uma penca de absurdos a vicejar em seu dia-a-dia e que passaram ao largo das discussões e discursos dos senhores candidatos a prefeito. Por exemplo, a ocupação diária indiscriminada e criminosa dos espaços públicos por vendedores ambulantes; por exemplo, o caos no trânsito ocasionado por motoristas e motociclistas que minuto a minuto fazem das ruas estacionamentos ou praças de guerra onde a lei do trânsito não vigora, simplesmente não vigora; por exemplo, a realização semanal e criminosa de feiras públicas que obstruem ruas, avenidas, praças e qualquer logradouro que se preste a espaço de negociação e vendas, como verdadeiras lojas a céu aberto.
            Taxei de criminosas as supracitadas realidades fortalezenses porque, segundo consta, tais práticas são proibidas por lei municipal. Corro o risco de passar um atestado de ignorância com esta afirmação porquanto a lei possa ter sido modificada em tempo recente e isso não ter chegado ao meu conhecimento. Contudo, afirmo, com certa petulância, que, se tal ocorreu, estará a nova lei institucionalizando a barbárie e a injustiça fiscal.
            Antigamente havia o rapa. E o que era o rapa? Resposta: o rapa eram os fiscais da prefeitura que chegavam sorrateiramente para confiscar os produtos vendidos nas calçadas e nas ruas das cidades, munidos de completo aparato policial para fazer valer a lei. Estava-se na rua quando, de repente, ouvia-se o brado inconfundível: –“Olha o rapa!” Era, então, o pandemônio, uma correria geral com gente arrastando as bancadas e a muamba pelas ruas secundárias em meio ao povaréu que ia e vinha. Então, pergunto aos meus raríssimos leitores: – onde, em nome de santo Epitácio, foi parar o rapa? Novamente respondo: o rapa não existe mais. E o que significa o sumiço do rapa? Ora, significa exatamente a barbárie e a injustiça para com os comerciantes que andam dentro da lei. E nem estou a falar das feiras onde se vendem produtos roubados!
            Eis, então, que pergunto: – qual candidato falou sobre a intenção de fazer cumprir a lei? Repito, não assisti a nenhum debate, a nenhuma propaganda política no horário reservado na televisão, a nenhum comício. (Houve comício?) Mas, arrisco sem medo de errar – nenhum deles falou sobre o tema. E por que não falou? Porque o político brasileiro é um pilantra que só pensa em sua carreira. E estamos conversados. Ele evita temas “antipopulares” receoso de perder votos. Ora, há aqui um evidente pacto de mediocridade entre o povo que detesta a lei e o político que quer se tornar prefeito. As obras conquistam o povo medíocre enquanto a lei...
            Falou-se que iriam melhorar a saúde do município. Vejam bem – prometeram melhorar a saúde do município! A doença mais prevalente nesta decadente cidade é a violência. Pois o senhor atual prefeito, candidato à reeleição, está a erigir um hospital anexo ao maior centro médico de atendimento ao traumatizado do Nordeste, o Instituto Dr. José Frota (IJF). A violência grassa solta, célere, incontida, irrefreável... Que se ideou fazer? Outro hospital, outra obra. Não sei se percebem. O povo talvez veja nisso uma grande realização, mas... e a violência? Não seria mais barato e mais humano conter a violência? Parece que não. Está aí o pacto medíocre. E sejamos francos – nenhum dos candidatos pode fazer algo para conter essa praga que se alastra entre nós. Digo isso e percebo que estou enganado. Eles podem fazer algo: cobrar com seriedade das instâncias competentes a que tomem medidas urgentes para tal. Não cobram. Não querem se indispor com seus comparsas, digo, aliados. Seu discurso é evasivo quanto ao ponto nevrálgico da questão. Estão lucrando com a violência, eis a verdade.
             Dessa pobre e tendenciosa reflexão lastreada em fatos gritantes do dia-a-dia de uma cidade miserável cujo povo se vendeu faz tempo, concluí o inexorável – não há um que preste. Sim, nenhum tem moral, estão todos vendidos, exatamente como o povo que há de elegê-los. Enquanto isso, as ruas repletas de bandeiras, as carreatas, os “santinhos”, os debates vazios que só se prestam a discussões inúteis e infrutíferas, tudo uma encenação patética, uma pantomima cruel. Educação, escola, emprego, trabalho... sobre tudo se fala, sobre tudo se promete uma medida salvadora, enquanto não têm coragem de fazer cumprir uma única e mísera lei, a título de exemplo. Dá para acreditar em alguma coisa que saia dessa fornalha maldita? Minha intuição me diz que não...      

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