segunda-feira, 19 de novembro de 2012

Uma desculpa esfarrapada


          Brasinha é o amigo dos fetiches. Outro dia relatei episódio em que protagonizou a quase realização de uma tara, uma fantasia. Não a levou a cabo por uma simples razão: a namorada passou mal ao vê-lo fantasiado de Brasinha. Daí seu apelido. Para quem é desconhecedor do fato, resumi-lo-ei ao máximo a fim de adentrar na pauta.
          Meu amigo queria um sexo diferente e, para tanto, nutria uma fantasia que o torturava: - queria sexo fantasiado de diabinho, vestido com chifres, máscara, cauda, e tudo o que tinha direito. No motel com a namorada que, desavisada de tudo, o aguardava sob os lençóis no quarto frio e seco, vestia no toalete a indumentária própria do ser maligno. Dali a pouco, na escuridão do cafofo, aproxima-se da mulher que, vendo aquela presepada, é acometida de dispnéias e precordialgias ferozes. Acabaram na emergência d'algum hospital da cidade, ela quase morta do susto.
           Pois sucedeu o que seria de esperar a um mancebo dado a esses arroubos incontroláveis e inconfessáveis: - contraiu núpcias. De tão velho que era, sua solteirice já incomodava a alguns familiares e amigos mais distantes. Chamavam-no "rapaz velho", que por estas paragens abrevia-se por pura preguiça na expressão "rapai véi". Meu querido Brasinha era um "rapai véi". 
          Não sei se era o caso, mas quero crer que meu amigo esperava no casamento realizar todas as suas indizíveis peripécias sexuais. É lógico se acreditar que a mulher seria sua parceira em tais aventuras, e um alívio geral tomou conta de todos os que se achavam de alguma forma apreensivos com tão prolongada solteirice. 
          O que ocorreu, entretanto, leva-nos a concluir que a senhora Brasinha jamais tomou ciência dos desejos do marido; não dos desejos que se enumeram abaixo dos limites de uma curva de Gauss. Por isso Brasinha via-se impelido a procurar fora do lar o que já determinara lá ser impossível achar. 
          Certo dia, a mulher pejada de sete meses, logrou marcar encontro com uma dona cuja origem permanece a mim desconhecida. Brasinha, como todo elemento dado à caça do esporte sexual, tinha lá, é bem possível, as fontes donde brotam as pequenas que se permitem alinhar com tal jogo, de modo que, o que importa para nós que aqui estamos a relatar o drama, é que se conheça o desfecho do projeto de meu amigo.
          Também não me foi dado a conhecer as razões que levavam sua mulher a estar, nos últimos tempos, a segui-lo aonde quer que fosse. É bem provável que ela já sentisse ou percebesse o que lhe reservava aquele marido de aparência séria e compenetrada, formal e respeitador, um cínico de marca maior.
           Foi à saída de um grande shopping da cidade. Estava dentro do carro com a referida dona, uma mulher de aparência duvidosa, parado ao estacionamento esperando sabe-se lá o quê. Ao que parecia, esperavam o melhor momento para dali saírem em segurança no rumo d'algum tugúrio onde pudessem ficar à vontade. 
          Eis que, repentinamente, a um dos lados a mulher, ao outro a sogra, vê-se cercado e apupado por todos os piores adjetivos de que se tem notícia. A sogra, percebendo o crescente desvario da filha, contornou o veículo para segurá-la antes que fizesse uma besteira, ela gritando a plenos e limpos pulmões: -"Ai, meu pai! que vou parir esse menino aqui mesmo!" E emendava: -"É muita decepção! É muita decepção!" Foi preciso que ele subisse os vidros para não ser atingido por todos os socos e tapas que a buchuda desferia em sua direção. A mãe, há pouco contribuindo ao coro de impropérios ao femeeiro genro, tudo fazia a arrastar dali a filha, já arrependendo-se de a ter acoitado em semelhante e tresloucada missão. 
           Não me recorda agora como o episódio findou, mas o que se sabe é que a mulher passou os dois últimos meses de gestação em casa de seus pais. E se voltou à convivência do fulano nem mesmo sei eu. 
           Outro dia ele me bateu o telefone portátil a intimar-me a "beber o mijo" do pequerrucho. Não fui por receio de me rir ao lembrar da cena descrita acima. Além disso, estava louco para conhecer a fantasia de diabinho que o amigo guarda n'algum baú de seu sótão. Se trouxesse à baila mais essa perversão, seria de lá expulso sumariamente. Optei por uma desculpa esfarrapada. 

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