segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

HAMBÚRGUER E CACHORRO-QUENTE

"Que coisa adolescente, James Dean"... (Belchior)

Eis que não houve, na última quinta, o clube do Bolinha. A quem não se lembra, relembro que o clube é um espaço reservado exclusivamente para meninos. Disse espaço e corrijo – é um momento reservado exclusivamente aos meninos. (Quem quiser mais detalhes que pergunte às Luluzinhas.)
                Pois os meninos avisaram com antecedência: não poderiam comparecer. (Os “meninos” são os cinquentões.) Foi nesse cenário que o amado Fábio Motta me incitou a acompanhá-lo ali, em certo barzinho, em duas ou três cervejas. Aceitei incontinenti. Não podia me dar ao luxo de perder a oportunidade de estar com tão fugidio amigo.
                Era uma hamburgueria, um lugar intensamente frequentado por adolescentes. E assim me vi, sem maiores considerações, num bar adolescente a convite do Meninotti, digo, do Fábio Motta.
                Vejam que abundam em nosso anedotário particular as muitas histórias do Meninotti Motta, as últimas dando conta de sua regressão comportamental. Perguntará alguém estupefato: – como assim, regressão comportamental? Explico.
                Não se sabe exatamente há quanto tempo o nosso Fábio de Oliveira Motta acordou certo dia e decidiu: – “quero ser menino outra vez”. Daquele momento em diante, como numa mágica de Sininho, tudo mudou. Seus ternos mais finos foram arrumados num fundo de baú e suas gravatas foram doadas a um brechó. As poucas cuecas que ainda guardava foram cedidas aos filhos da lavadeira. Em pouco mais de quinze dias o guarda-roupas era outro. Quem o abrisse diria ser o de um garoto de seus dezessete, dezoito anos. Eis renascido outro Fábio Motta, um obsessivo e obcecado Peter Pan.
Óbvio é que outras coisas aconteceram até culminar na constatação da mudança irreversível – o homem agora comia hambúrguer e cachorro-quente. Antes era churrasco de carnes nobres e até panelada, sarrabulho e sarapatel. É bem verdade que toma lá umas cervejas, mas... e daí? Não as tomam também os adolescentes? Mesmo aí há uma alteração radical. Afinal, o nosso Motta, até seu último dia como adulto, apreciava o chamado “álcool duro”, isto é, uísque sem gelo. E se lhe punha uma pedrinha seria apenas para enganar a torcida. Numa noite bebia uma garrafa inteira. Coisa de gente grande, de gente adulta. O adolescente em que se tornou bebe apenas cerveja. E se lhe perguntamos sobre o uísque, responde que está levando uma vida saudável, que dorme cedo e levanta cedo para... surfar. Sim, o Motta voltou a ser surfista, esporte que praticou durante toda a adolescência. Como o fôlego já não é o mesmo de há 40 anos, faz aulas de apneia.
Vejam que não saiam por aí a dizer que faço apologia ao alcoolismo. Não é o caso, acreditem. Meu único propósito é expor as diferenças entre um Fábio Motta e outro Fábio Motta. Um seria o clássico, o outro o moderno ou, mais precisamente, o saudoso. O tipo adolescente permanece intacto desde James Dean.
O que me pergunto até agora é: – que acontecimento precipitara o novo e improvável Fábio Motta? Eu disse que “certo dia” o homem acordou e decidiu. Mas... que dia teria sido esse? O que aconteceu àquele dia ou à véspera? Sininho teria tantos poderes? Seria um amor que se perdeu na frustração da inviabilidade? Seria a descoberta em si mesmo do homem só, e sempre só, invariavelmente só? Seria tudo uma espécie de crise da meia-idade? a insegurança que abate aquele que se vê cara a cara com a velhice e com o apartamento de todos ou quase todos os laços vitais e essenciais? Ou seria apenas mais um chiste de meu amigo a se somar a tantos outros?
Passou-me pela cabeça uma doença, sim, um mal irreversível e inexorável, desses que deformam o indivíduo a ponto de tornar-lhe irreconhecível ou incapaz, e que lhe impusesse o momento único de voltar a ser o que amou ser um dia. Por último considerei a maldita, algo mortal, sentença do inelutável momento... Para felicidade de todos que muito o amam, não parece ser este o caso. Ele exala a saúde humilhante dos de excelentes genes. É espécime dos que vivem cem ou mais anos, tudo culpa do Agapito e de dona Mirtes, seus amorosos e zelosos pais, longevos e vivazes.
Quanto a nós e nossa investigação, tudo tem sido em vão... Ao que tudo indica, seremos obrigados a conviver com o “Meninotti” Motta por sabe-se lá quanto tempo, o tempo que durar sua incursão adolescente. Será dureza ensinar a esse menino tudo outra vez. É tudo o que posso dizer agora. Oportunamente volto com novidades. 

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