quinta-feira, 5 de janeiro de 2017

UM ESQUECIDO BLOG

Há tempos não leio meu próprio blog e confesso – me esqueci completamente que tenho um blog. Os amigos mais chegados dirão que estou a fazer pilhéria, que isso não tem o menor fundamento etc. etc. O fato é que está ele lá. É só conferir. Há quanto tempo não lhe acrescento uma frase, uma vírgula, um ponto de exclamação? Diria até que bem merecia que lhe ocupasse hoje uma página inteira com um enorme ponto de interrogação. Sim, porque há uma questão aqui. E grave, diga-se de passagem. Por que, em nome de todos os santos, esqueci-me de meu blog?
                Haverá alguém a argumentar que tenho republicado antigos textos à rede social, e direi que, sim, é verdade. Entretanto, devo dizer que o fiz com a automaticidade de um robô. É possível que a atitude tenha sido consequência de um tipo de ato falho ou coisa que o valha. Contudo, nada disso apaga o fato incontestável – a última página do blog permanece lá, sem acréscimos, sem atualizações. Aos dias de hoje tal “atitude virtual” há de levantar nefandas suspeitas sobre o destino do autor. Vejam, por exemplo, a rede social. Em cem anos estará repleta de perfis defuntos. O sujeito tem lá a sua página e, súbito, morre. Dali em diante cessa-lhe também a vida virtual. É possível que o mesmo não ocorra se morrer apenas na virtualidade, mas as suspeitas serão inevitáveis, repito. Assim, antes de mais nada, afirmo categoricamente: estou vivinho da silva.
(Há amigos que jamais nasceram para a vida das redes sociais. São nonatos virtuais. Jamais deram as caras em qualquer “sala” virtual. Estão livres das exposições alheias e resguardados de suas próprias. Nem todo mundo quer ver a nudez dos outros; nem todo mundo cede ao ímpeto de propagar-se a si mesmo arrojadamente e inescrupulosamente.)
Percebo agora que não era nada disso o que eu queria falar. Voltemos ao assunto do blog, e volto à pergunta – por que me esqueci dele? Penso, penso, penso... e concluo sem delongas – não faço a menor ideia. Sim, não faço a menor ideia do porquê desta amnésia particular. Não me fez falta sua ausência. Dele não senti saudades. É provável que também ele não tenha se dado conta de meu sumiço. Paciência. Pior que isso – os leitores, o mínimo que pude angariar, não perceberam. Como eu disse, há aqui uma grave questão.
Pior está o Temer com o pepino da “crise penitenciária” brasileira. Ora! Não há crise penitenciária! Há, isso sim, uma gravíssima crise na segurança pública que se arrasta há décadas e ninguém, nenhum governante, teve coragem de a encarar por puro populismo. O Temer, com sua baixíssima popularidade, tem todas as credenciais para dar o pontapé inicial. É mais ou menos óbvio que sua atuação tem limites aqui. Com um Código Penal imprestável e um sistema judiciário mais imprestável ainda, não há muito o que Temer possa fazer, mesmo do alto de sua elevadíssima impopularidade, de quase 90%.
Bem se vê como o destino nos ensina as lições mais inesperadas da vida. Aprendemos recentemente que a pior qualidade que um político pode ter é a alta popularidade. Quem diria...! Quanto mais elevada a popularidade de um governante, menos ele fará, menos será capaz de fazer. Ao sujeito muito popular falta a coragem de fazer o que deve ser feito, donde se conclui que governar é um exercício de fomentar o ódio presente a fim de, talvez, quem sabe, colher o amor futuro. Ou pelo menos o respeito futuro. Acima de tudo, temos aprendido que governar exige responsabilidade, equilíbrio e senso de alteridade. O povo, as massas, os ajuntamentos são ignorantes, irresponsáveis e cruéis. Demanda do governante a que satisfaça seus instintos mais primitivos e a que tome as decisões mais inconsequentes e insensatas, o que reforça a necessidade imperiosa da impopularidade governamental. Não nos esqueçamos: as massas se esgoelavam e gritavam exalando ódio e babando pelo canto da boca – “Crucifica-o! Crucifica-o!”
          Minha grave questão, repito, é o blog. Eu disse que tenho um blog esquecido. Na verdade, tenho três. O mais recentemente esquecido torna-se agora objeto dessas reflexões, uma vez que nele concentro minhas impudicas e reprováveis reflexões, ou onde deposito umas poucas histórias do dia-a-dia. Os outros? Quem porventura der com eles à busca de um assunto qualquer, há de imaginar que o autor já é morto e que seus ossos há muito jazem secos numa campa quente e úmida... 

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