A revista Veja, como dizem muitos amantes da verdade e muitos paladinos de nossos sérios e compenetrados homens – e mulheres! – de “esquerda”, mentiu mais uma vez. Espera aí. De fato, a revista mentiu várias vezes numa única vez. Quem não sabe o que digo que leia a reportagem que o semanário publicou em sua última edição sobre a nossa seríssima prefeita Luizianne Lins. É um rosário de mentiras.
Certa vez escrevi sobre o que me parecia um absurdo – a prefeita de Fortaleza patrocinava festas populares caríssimas e faltava dinheiro para a manutenção de seu hospital mais importante. Tenho uma amada amiga que é prefeita de cidade do interior. Ao ler o que escrevi, ela comentou: se o prefeito não faz a festa o povo se revolta, fica furioso, não admite a vida sem as festas da prefeitura. Pensei: não sei nada de povo. E concluí que o prefeito deve fazer o que o povo quer.
Hoje dei de cara, no hospital, com vários doentes internados. Dirá alguém que bebi, ou que me acometeu o surto de alguma doença mental. Tranqüilizo-os: nada bebi e, afora as imperceptíveis e ínfimas variações do dia a dia, a cabeça vai muito bem, obrigado.
No hospital IJF, do organograma municipal, uma extensa lista de doentes em pós-operatório, vítimas de trauma vascular, não é a regra. Mas eles estavam lá justo hoje, ainda sob a ressaca da muito bem pontuada e elegante resposta pública que a senhora prefeita e seus asseclas deram à revista Veja. A propósito, devo sugerir a ela e aos senhores que a assessoram que escrevam para a revista, se é que já não o fizeram. É quase certo que suas considerações serão publicadas. A revista mente, mas dá direito ao contraditório. Já tive oportunidade de ver várias de suas mentiras serem prontamente rebatidas por suas vítimas em suas próprias páginas. Essa revista só emprega gente maluca. E dizem que é golpista. Passou oito anos tentando dar um golpe de estado no governo do gordinho bêbado apedeuto salvador da pátria.
Mas voltemos ao hospital. Muitos doentes: tiro, facada, colisão de motocicleta, acidente de trabalho, aterosclerose obliterante, etc. etc. etc. (No IJF os doentes não têm nome. São todos ou uma doença, ou um acidente, ou uma agressão.) Vamos trocar o curativo da colisão de motocicleta? Estão em falta gaze, atadura, esparadrapo, algodão ortopédico, etc. etc. etc. Procuremos o prontuário do paciente onde possamos relatar por escrito como ele está e escrever os medicamentos que se lhe devem administrar hoje, ler o relatório de sua operação, recapitular sua evolução nos dias precedentes, inteirar-se de seus exames, enfim, procuremos o documento legal importantíssimo que ele é.
O que acho? Prontuários desorganizados, sem capa – as capas estão em falta também – e contendo papéis avulsos a ponto de se perderem. Na ocorrência de um litígio o hospital sem documentos fica a ver navios e Sua Excelência, o juiz de Direito, pode facilmente punir a ambos, o hospital e o doutor, não sei lá por que motivo.
Finalmente consegui o relatório cirúrgico da colisão de motocicleta. O cirurgião operador da colisão relatou que fez a anastomose, na perna, da veia que serviria de enxerto com a artéria – anastomose é a emenda de uma à outra – com um fio cinco zeros, mais grosso, porque o fio ideal para isso que é o seis zeros, mais fino, está em falta. Direi apenas aos meus leigos leitores que uma anastomose delicada como essa deveria ser objeto de melhor trato. Afinal, dela depende a viabilidade da perna da colisão de motocicleta.
Resumamos. Falta de tudo no Instituto Dr. José Frota (IJF), hospital mantido pela prefeitura de Fortaleza, sob a gerência da seriíssima e excelentíssima prefeita Luizianne Lins, vítima inconteste da revista golpista que quer apeá-la do poder para lá empossar alguém de seu interesse. Os amantes da verdade saídos das fileiras da administração municipal garantem: seus fornecedores estão sendo pagos em dia. A prefeitura é a grande vítima dos fornecedores inescrupulosos. A grande verdade é que a prefeitura não gasta um centavo nas festas que promove.
Se eu der ao meu ignorante filho de dez anos tudo o que ele quer e negar-lhe o mais importante, que pai serei eu? É precisamente essa a analogia que faço entre os pais de pequeninos e naturalmente ignorantes filhos e os prefeitos que administram a ignorância do povo. E os aconselho – se conselho fosse bom não se o dava, se o vendia –: façam o que precisa ser feito; não façam o que é irresponsável.
Penso seriamente em convidar um repórter de Veja para visitar o hospital. Quem sabe ele não engendra uma mentira escabrosa sobre ele? Como mentem com facilidade assombrosa, não lhes será difícil a tarefa.
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