terça-feira, 24 de janeiro de 2012

Olhando Betelgeuse

          Desde há algum tempo tenho manifestado abertamente minhas reservas em relação às redes sociais. Sou mais afeito ao ósculo, ao amplexo apertado, ao aperto de mão, à caminhada lado a lado, enfim, à presença real do amigo. Disso os que me conhecem sabem, e penso que mesmo os que me não conhecem também. Além disso, digno de nota é a série de equívocos ou situações que deram ensejo a males-entendidos de toda espécie tendo como cenário a rede social. 
           Assumo: fui vítima de situação vexatória uma meia dúzia de vezes por exposição excessiva na rede social. A rede social expõe o indivíduo mesmo que ele escolha não se expor. É precisamente o meu caso. Não me vejo impelido a expor o que faço, meu estado civil, se tenho filhos ou não, onde trabalho, se viajo ou não, se gosto de cerveja ou vinho, onde estudei, na rede social. Mentiria se dissesse que nunca o fiz. Fiz. O erro é excelente professor. O diabo é que se tem amigos que adoram se expor na rede. Uma pose em fotografia com eles e lá estará você para todo o planeta saber onde e com quem você estava, o dia e a hora. Pergunto: pra quê? 
            Dizia o Roberto Carlos numa canção antiga que "às vezes as mentiras também ajudam a viver". Outro dia eu dizia que não mais tinha idade para mentir. Não mais me disponho a mentir a mentira que fere, a mentira que esconde minhas mais essenciais verdades ou que se cria para levar vantagem sobre alguém. E minto. Ainda minto a mentira inconseqüente, quando não quero explicar detalhes do que só diz respeito a mim. Afinal, a privacidade e o pudor são louváveis e necessários para um mínimo de intimidade consigo mesmo. Não se deve esquecer que as pessoas já sabem tudo sobre você e freqüentemente têm soluções para os teus problemas. Mesmo que não se divida nada com elas, estão sempre interferindo, ainda que não convidadas a tal. Imagina se as municiarmos com mais detalhes que versem sobre nossa vida pessoal.
          Outro dia publiquei na rede social um texto que escrevi há alguns anos, onde exponho minha indignação com um colega de profissão que falou mal de mim. [O texto está em meu outro blog "O Desocupado" (http://fecavalcanti.facilblog.com/Primeiro-blog-b1/Vergonha-sobre-mim-b1-p29.htm).] O resultado é que algumas pessoas, aparentemente totalmente desprovidas de sensibilidade, nada entenderam. Ou, por outra, entenderam tudo da forma mais equivocada possível. Não tiveram a menor perspicácia para perceber que o texto é, todo ele, um rasgado auto-elogio oculto entre palavras de aparente autodeprediação – caíram na armadilha que lhes preparei. Vê-se bem que as pessoas estão propensas mais a expor seus próprios problemas do que a se deixar enlevar pelo que o outro está dizendo. Em outras palavras, elas entendem o que bem entendem, entendem o que querem, numa fragorosa explosão de atos falhados. 
          Mas estou falando, falando, e ainda não digo o que quero. O que quero dizer é que não somente a rede social, mas também o telefone portátil é fonte de desentendimentos, e frustrações, e enganos, e males-entendidos de toda sorte. Outro dia eu perguntava a um amigo: -"Quem precisa de um celular?" Hoje há um código implícito que define como se deve comportar na "mídia". Quebre as regras e estará sumariamente condenado. Quem pensar que o telefone portátil não se enquadra na definição de "mídia", engana-se. Exemplo: receba uma ligação e não retorne. 
           (Ainda não digo o que quero dizer!) Dizia o Casoba – ou dizia ele o que outro dizia – que se Deus não existe então tudo é permitido. O descomedimento, por exemplo. Toda reação temperamental é descomedida. Mesmo que nos sirvamos da terceira lei de Sir Isaac, aplicada por extensão às interações entre os homens, uma reação a uma ação deveria lhe ser, se não igual, pelo menos proporcional. Às vezes ferimos sem querer, sem a intenção. O coração do ego do homem é por demais sensível. Exalta-se com uma brisa, uma tênue lufada, um discreto balouço. É nossa tendência à exaltação própria que nos faz assim. Policiar-se é necessário, é altamente recomendável. 
            Termino sem dizer o que queria dizer, o fato doloroso e lastimável que me lançou neste devaneio talvez impróprio. Deixemos quieto. Convém à noite, mais tarde, olhar as estrelas em Órion, ver Betelgeuse, o portal da casa de Deus.

2 comentários:

  1. Alguém pode não ter entendido...Todavia como tenho manias de ler nas entrelinhas...também não vou espor minhas conclusões,posto que o próprio autor se eximiu de tal.Fazer leituras abstratas (isotópicas) ou não,dos textos, é minha prática.Recolho-me ao meu papel insignificante, de mera apreciadora das crônicas do escritor Fernando Cavalcante,também preparando-me para olhar a constelação de Órion, da qual sou também admiradora incondicional.E a prova é esta:

    ODISSÉIA ESTELAR


    Em meio às miríades de estrelas
    Eu quero viajar.
    Ter contato com a Plêiade,
    Que viaja sem parar.

    Passar por Órion e meus olhos encantar.
    No espaço sideral imaginar
    Que estou com Arcturo,
    O fujão.

    Para outros mundos da Via Láctea,
    Eu sei que vou andar
    E escolher meu universo,
    Onde vou morar.

    Zinah Alexandrino,in: SUTILEZAS,2006

    ResponderExcluir
  2. Também, depois de tal sugestão, caro Fernando, apreciarei as estrelas! Ainda mais, ESPECIALMENTE, à procura de Betelgeuse, inspiração para meu avô paterno (Tito de Castro Menezes, quando batizou minhã AMADA mãe por GEUSA Gondim de Menezes, em homenagem à estrela.

    ResponderExcluir

O NARCISO DO MEIRELES

Moravam numa bela casa no Parque Manibura.  Ela implicava com ele quase que diariamente. Era da velha guarda, do tempo em que o homem saía c...