quarta-feira, 9 de março de 2011

Abandonados

Há um ano Marcela Montenegro, uma belíssima jovem empresária desta cidade, levou um tiro na cabeça e faleceu três dias depois. Foi num assalto. Os assaltantes eram, e presumo que ainda sejam, pobres. Em meio ao grupo uma criança de onze anos, usada para se jogar diante do carro e provocar sua parada a fim de que o crime fosse perpetrado. Como Marcela reagiu à abordagem não parando o veículo e imprimindo-lhe maior velocidade para evadir-se, um dos homens detonou sua arma de fogo e a bala atingiu-lhe o crânio, ceifando-lhe a vida.
            Uma onda de perplexidade varreu a cidade, como um terremoto de magnitude 3,0. É sabido da sismologia que um tremor de tal intensidade é sentido, mas raramente causa danos. Nenhum dano foi registrado na sociedade causado pela forma brutal, covarde e inconseqüente com que Marcela Montenegro foi morta. Perplexidade é como uma intenção – em nada contribui. O único verdadeiro distúrbio se deu no seio da família da moça. Um ano depois ninguém sabe como estão se sentindo seus familiares, mas presume-se que ainda estejam zonzos com o excepcional evento.
            Noticiou-se hoje em jornal de grande circulação no estado que o garoto que estava com o grupo que assaltou e matou Marcela foi “apreendido” por assalto no mesmo local em que a jovem foi executada. Ao que parece ele estava na companhia de um jovem de 25 anos, e ambos estavam armados de faca.
            Não acusemos precipitadamente o garoto. A única coisa que podemos dizer sobre ele é que não costuma andar em boa companhia. O problema é o que o Johann Goethe disse: “diz-me com quem andas e dir-te-ei quem és; saiba eu com que te ocupas e saberei também no que te poderás tornar.” Segundo ele, nosso “menino”, hoje lá com seus 12 anos de idade, é um facínora semelhante aos que acompanha e está em vias de se tornar um exímio profissional do crime. Quem diz é o Goethe, não sou eu.
            Não sejamos tão duros. É perfeitamente possível que o garoto só tenha estado em atividades ilícitas justamente essas duas vezes no último ano – na noite em que Marcela foi baleada, em 09.03.2010, e no último domingo em que foi “apreendido”, 07.03.2011. Nesse intervalo de tempo ele devia estar envolvido com a escola onde estuda, ou com a família ajudando sua mãe, pai e irmãos.
            Estou indo longe demais. O “menino” é pobre e deve ter sido gerado no seio de uma família desestruturada. Não vai à escola há anos e por tudo isso entrou bem cedo para o mundo do crime. Não se explica como, num país cujo governo de “esquerda” que já dura mais de oito anos – o garoto devia ter três a quatro quando ascendeu ao poder –, esse garoto permanece nessa vida devassa, sem esperança, sem futuro, sem ninguém que lhe socorra. Não é mesmo possível explicar. Os correligionários estão todos os dias mostrando e explicando como os pobres estão menos pobres, como sua educação melhorou e como, por se ter alcançado esses índices, a criminalidade decaiu vertiginosamente.
            Fui ver o que ocorre na Grã-Bretanha. Além de Sobral, sou um obcecado pela Grã- Bretanha. Por ter 23 crianças presas por 100.000 habitantes (cerca de 200 mil crianças atrás das grades), a maior taxa da Europa, os ingleses estão buscando alternativas. Entretanto, “os políticos parecem relutantes em adotar qualquer medida que dê a impressão de que eles estão sendo pouco severos com o crime. Eles estão presos ao ‘complexo do pânico’, à politização do crime e à preocupação de que podem perder votos por não parecerem rígidos o suficiente.” Os políticos ingleses parecem estar ressabiados com os grandes criminosos da história. Têm pavor ao crime. Compreende-se.
            Por outro lado, é provável que aqui fosse como lá, ou seja, “as crianças detidas vêm, com freqüência, das classes sociais mais baixas, que em 1980 representavam 10% da população da Inglaterra e subiu para 34% em 2002. Um estudo conduzido em 2001 pelo órgão que coordena as prisões britânicas descobriu que 84% das crianças encarceradas foram excluídas da escola, 25% tinham conhecimentos de matemática e capacidade de leitura equivalentes aos de uma criança de sete anos, e 37% descreviam seu nível educacional como nulo.” Parece que lá eles não falseiam as estatísticas. São sérios demais para isso.
Contudo, há casos que ficaram famosos e cuja decisão judicial pareceu justa ao país e ao resto do mundo, como o dos “dois irmãos de 10 e 12 anos que torturaram e espancaram brutalmente dois garotos da mesma idade. Foram condenados pela Justiça inglesa a permanecer na prisão por tempo indeterminado”. Na sentença o juiz escreveu: “Foi uma violência sádica e prolongada apenas para que vocês se divertissem machucando e humilhando eles. Estou certo de que os dois representam um alto risco de causar sérios danos a outros”. O mais velho deles justificou sua violência por “estar entediado por não ter nada para fazer”. Um relatório do Conselho de Segurança das Crianças do país mostrou que os irmãos apresentavam um histórico de agressões. Os ingleses adoram os históricos. Tudo indica que, para eles, têm uma importância tremenda.
            Parece que, sem levar em conta o problema social de que o nosso “menino” é vítima, e não querendo minimizar tal dado, parece que ele tem um mesmo e semelhante histórico de agressões. Os dois meninos ingleses foram condenados a ficar no mínimo 5 anos atrás das grades.
            A pergunta que fica no ar é: por que esse “menino” está solto entre nós? E outra: se o Estado entende, através de seus doutos legisladores, que não se o deve prender, por que ele não indeniza as vítimas desses reincidentes criminosos que não são criminosos sendo criminosos? Parece ser uma prática regulamentar soltar facínoras e monstros, como, por exemplo, o que estuprou e matou a linda menina Alanis. O monstro era condenado e estava solto por um indulto estatal.
            Continua nos faltando a guerra que nos transformaria dos medíocres que somos no país glorioso que ansiamos ser. Na guerra em andamento em solo pátrio estão vencendo os criminosos. É uma guerra suja e covarde em que até as armas nos confiscaram. Ela gera em nós esse sentimento de frustração e abandono que sinto agora. 

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