segunda-feira, 4 de fevereiro de 2019

VEXAMES DE UM TAXISTA

Vocês certamente não conhecem o Carlão. E, se tiveram a sorte de conhecê-lo, terão o azar de tê-lo esquecido. Carlão é um dos taxistas que fazem ponto defronte o edifício onde moro. É um sujeito boa praça, tem família, dá assistência à mãe idosa e trabalha feito uma máquina. Eis aí em pouquíssimas palavras o Carlão.
            Outro dia fez uma corrida para uma das meninas que saem com os gringos. Não sei se sabem, mas nossa cidade está repleta de estrangeiros. Espera-se que no próximo censo a população local tenha crescido muito à custa deles. Desconheço qualquer projeto científico ou contribuição ao país por parte desses ilustríssimos senhores quando vêm parar aqui. Há dez ou vinte anos isso não acontecia. As autoridades não querem saber, desde que eles tragam dinheiro. Elas parecem não saber que seu dinheiro não traz nem gera riqueza sustentável. As autoridades não parecem se importar com isso. Elas, nossas autoridades, são suas primeiras prostitutas. De quebra eles comem nossas filhas.   
            Por que é mesmo que estou falando disso? Ah, lembrei: - a menina da corrida com o Carlão. Vejam bem: - a corrida foi um ato profissional de meu amigo taxista. E o que aconteceu? A garota queria transformá-lo num ato profissional seu! Chegando ao destino, a caterina ofereceu a Carlão, como pagamento pela corrida, um fellatio.
O que se seguiu não me foi dado a conhecer. Carlão contou-me esse episódio demonstrando uma indignação colérica. Presumo que tenha declinado da oferta e tenha recebido a corrida em espécie. Não é homem de se vender por pouco. Precisa sustentar a filha.
Contudo, se o táxi do Carlão lhe proporciona esse tipo de contrariedade, há de proporcionar ainda outra, e outra, e outra. Os gringos, a julgar por seu relato, não são tão endinheirados assim. Não é raro encher o carro de marmanjo que não quer pagar a corrida, ou que pede desconto, ou que quer pagar fiado. Os borra-botas devem vir ao Brasil com o dinheiro contadinho e, em que pese o câmbio a lhes favorecer, partem de volta sem nada nos bolsos. Igualam-se aos atletas do Fortaleza que moram na vizinhança. Ou moravam. Com a reciclagem no plantel devem ter voltado ao buraco de onde vieram.
Com tanta vicissitude, Carlão resolveu certo dia ir ao Oásis. O Oásis vocês conhecem, não? O bom do Oásis é as terças, mas parece que aos sábados a coisa também esquenta por lá. Que diabos, um homem não pode nem deve ser perfeito! Dizia Nelson Rodrigues que o bom marido é uma mistura medíocre de virtudes e defeitos. É o caso do Carlão. Queria viver, naquele dia, seus defeitos, bem longe da mulher, que ninguém é de ferro.
Abordou uma dona vistosa que estava na mesa com mais três amigas. Tirou-a para uma dança. Ela topou. E rodopiaram no salão por mais de hora, ao final da qual ela o convidou a que se juntasse à mesa. Mais tarde, as amigas partiram e Carlão se ofereceu para levá-la em casa. Quando meteu a chave na porta do carro, a mulher explodiu: -“Você é taxista?!” E ele, inocente: -“Sou sim, por quê?” Ela saiu cuspindo cobras e lagartos, como se Carlão tivesse lhe passado a perna.
Será que ela pensou que Carlão iria ligar o taxímetro ao levá-la em casa? Se ele não pensou em ligar, deveria tê-lo feito.

Fernando Cavalcanti, 26.01.2010 

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